Lazer



E no entanto – disse eu, por força do destino – o mesmo que deseja todas as virtudes, de mesmo modo irá repugná-las, a menos que seja porque é inevitável. Acabei de proferir isto, como se conhecesse verdadeiramente o chão que calco e o caminho que percorro, e voltei costas a quem me ouvia atentamente. Eles não sabem, ainda, por que razão proferi tão convicto tais afirmações; nem sabem, tão pouco, o porquê de as ousar proferir ali, naquele instante. Nem eu. Disse-o como quem deita cartas. Disse-o como quem quer gostar de desejar. Disse-o assim…

Entretanto, voltei à minha realidade. Por nós esperava um almoço fugido à regra, num lugar mais acolhedor e com gente, gente de bom trato, a fazer-nos companhia – o Dr.Américo, devidamente acompanhado por Nantina, sua filha primogénita. A conversa, sem mais demoras, fluiu por si só: sem abordar nada em específico, os nossos pensamentos sobrevoaram África (Que Orionte tanto gosta!) e chegaram à Ásia, até que acabaram por regressar Portugal. O doutor olhava-me e ria-se. Tinha, estou certo que tinha, uma educação conservadora, com toda a cortesia que faz dele hoje um verdadeiro cavalheiro. Não sei porquê, de repente insistiu em falar de factos históricos, manchados por tragédias e malfeitorias, precisamente falou-me do tempo da Inquisição, e falou com tal desagrado que soltou uma calúnia absolutamente sentida à Igreja:
- Como ousam insultar a minha inteligência ao dizer-me que é arquitectura dourada e não arquitectura dispendiosa feita em ouro? Como? Os tempos medievais em que a palavra deles era tida como justa e équa já estão ultrapassados! Padrecos megalómanos que justificam a cobiça desmedida com Deus!
Bem… - pensou devidamente antes de o dizer, e continuou – há que respeitar as religiões, cada qual com as suas crenças e convicções, mas entrar em missas só porque faz bom parecer é que não!

Orionte esteve sempre a par da conversa, umas vezes concordando, outras nem por isso. Rimo-nos bastante em todo o almoço e chegou a hora de cada um tomar o seu rumo. Adeus, Dr.Américo! Até sempre!

Álvaro Machado – 18:13 – 14-08-2013

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