Ucrânia: abertura ou continuidade?

A Ucrânia estaria, indubitavelmente, prestes a entrar em recessão não fossem os contactos com Moscovo e o investimento de Putin na economia de 15 mil milhões de euros, bem como a redução do preço do gás em 30%, o que os leva, agora, a pagar 268,50 euros por cada mil metros cúbicos. (Sendo que o preço médio de gás no mercado ronda os 300€/1000cbm)

Em troca, Ianukovich cedeu a Putin activos estratégicos como a rede nacional de gasodutos, que os torna os principais transportadores de gás para o velho continente. Portanto, há aqui um equilíbrio de interesses, por assim dizer. Vejamos: o país estaria à beira da bancarrota e, após as negociações falhadas com o FMI para um empréstimo de 20 mil milhões, a Rússia, juntando o útil ao agradável, chegou-se à frente, colocou o dinheiro em cima da mesa sem dar outra hipótese senão aceitá-lo. Aceitavam as condições dos russos ou então, mesmo que procurassem de novo ajuda da Europa, os ‘mind games’ entre ambos surgiriam (coisa que acontece frequentemente) no que toca ao consumo e fornecimento do gás.

Aceitada a subserviência de Ianukovich perante os russos, as vozes da oposição fizeram sentir-se como nunca, encheram-se as ruas de Kiev, as manifestações estavam ao rubro e a violência entre cidadãos e polícias corria o mundo inteiro. A consequência é o estado caótico do país, com mortos, feridos graves e prisioneiros. As vozes contestarias subiram de tom pelo simples facto de não aceitarem que a Rússia entre pelo seu país, faça o que bem lhe aprouver como se não fosse a Ucrânia independente. Sem a Ucrânia, a Rússia perde influência.

Temos, portanto, dois desfechos possíveis para este novo governo democrático: pró-russo, que, diga-se, mais não será do que a continuidade de um país subordinado ao poder de Putin, fechado, corrupto; ou pró-europeu, e esse sim o mais viável, que terá uma maior abertura política, social e económica com a Europa, acolhendo a democracia de bom grado. Os corruptos já provaram há muito porque não devem estar no governo: primeiro com o bluff entre Alexey Miller, CEO da Gazprom, e da primeira-ministra, Yulia Tymoschenko, de reajustar o preço do gás de 179.50€ para 250€, pois, na verdade, haviam acordado dois meses antes um valor de 418€. O que levou os representantes das indústrias nacionais do aço e de fertilizantes a afirmar que o preço superior a 200€/1000cbm transformaria “lucros esperados em prejuízos realizados”; segundo com Ianukovich, que recusou a ajuda europeia para dar as mãos aos russos e às falcatruas da energia e que recentemente fez o congelamento de bens e fundos em contas bancárias na Europa, bem como o seu filho que tem acusações de lavagem de dinheiro.

Os riscos inerentes a uma adesão à União Europeia são dois: a situação economia do país e a questão da Crimeia. Supondo que a UE ajudaria financeiramente o país, só resta a Crimeia. Questão essa que é delicada. Sendo a maioria étnica russa (58%) contra a ucraniana e tártara (24% e 13%), as manifestações também surgem, mais a favor de Moscovo, onde apelam a intervenção militar russa, mas também a indignação e o orgulho ferido dos tártaros, que, durante a 2ª Grande Guerra, foram deportados em massa e alvos de maus tractos.
Com a perda de influência na Ucrânia, Putin tem aprovada a intervenção militar na Crimeia sobre alegada “protecção aos russos”, sabendo bem que o objectivo é segurar o seu domínio através da força.
Por agora, resta-nos esperar para saber qual será o porvir. Enquanto isso, achei também interessante fazer um pequeno à parte relativamente à visão do Partido Comunista Português sobre estes acontecimentos. Pois, acusa o partido, os países da UE são “imperialistas” ao quererem interferir nesta situação… Não sei o tipo de regime que pretendem então defender os comunistas: a Federação Russa? Essa federação fechada, com objectivos imperialistas – sim, essa sim é imperialista -, corrupta, obsoleta? 

Transcrevo a declaração do PCP para que possam ver:
“O PCP denuncia e condena a brutal ingerência e desestabilização dos EUA, da UE e da NATO na situação interna da Ucrânia que – promovendo e apoiando as forças de extrema-direita, neonazis e xenófobas e fomentando o exacerbar de tensões, de divisões e clivagens –, visa assegurar o domínio político, económico e militar deste imenso país, de forma a avançar na sua escalada de tensão e estratégia de confronto com a Federação Russa, realidade que representa uma acrescida ameaça à segurança e à paz na Europa e no Mundo.”

Está na hora de acabar com os joguinhos da Rússia com a Ucrânia, está na hora de deixarem de monopolizar a energia. Como diria um cronista ainda esta semana: “Com a europeização da Ucrânia, a Rússia passa de imperialista a um mero Estado-Nação, sem qualquer influência”.


Álvaro Machado - 21:10 - 01-03-2014

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